Ciclos de violência na Amazônia:

uma análise à luz dos conceitos de Violência Extrema e Real do Capital

Autores

  • Michael Franz Schmidlehner Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Acre - IFAC

DOI:

https://doi.org/10.36942/rfim.v3i1.771

Palavras-chave:

Economia Verde, Amazônia, Violência ultra-objetiva, O Real do Capital

Resumo

O artigo objetiva analisar certas formas de violência emergentes no con-texto dos projetos da chamada Economia Verde na Amazônia. Moradores da floresta denunciam que estes projetos, ao comprometerem sua autono-mia e seus modos de vida, exercem uma nova modalidade de violência “indireta”, que se soma à violência “direta”, à qual eles já estavam expos-tos anteriormente. A fim de compreender melhor esta nova modalidade de violência, dois conceitos em particular são aplicados: o de violência extrema, elaborado por Etienne Balibar, e o do Real do Capital, proposto por Slavoj Žižek, ambos inspirados pela topologia lacaniana do sujeito. Em um primeiro passo, o texto evidencia que as duas formas de violência supracitadas correspondem àquelas descritas por Balibar como ultra-sub-jetiva e ultra-objetiva e cuja interligação cíclica ele ilustra por meio da fita de Möbius. O segundo passo consiste em analisar a escalação de tais ciclos de violência através daquilo que Žižek descreve como irrupções traumáticas do Real do Capital e os esforços da ideologia neoliberal em reestabelecer a ordem simbólica capitalista. O artigo conclui que o pró-prio colapso climático e ecológico que vivenciamos hoje pode, em última consequência, ser entendido como incursão do Real do Capital. Assim, uma postura anti-violenta, que poderia interromper ou mitigar as dinâmi-cas da violência extrema, e, com isso, possibilitar alianças para proteger a floresta amazônica e seus habitantes tradicionais, exigiria uma melhor forma de lidar com a tendência paranoica inerente a nossa estrutura sub-jetiva e social, como apontada por Lacan.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Referências

ANGERMÜLLER, J. Diskurs als Aussage und Äußerung. Die enunziati-ve Dimension in den Diskurstheorien Michel Foucaults und Jacques La-cans. In: Ingo Warnke (Hrsg.), Diskurslinguistik nach Foucault. The-orie und Gegenstände. Berlin, New York: De Gruyter, 2007. p. 53–80.

BALIBAR, É. Violence and civility: On the limits of political philosophy. [s.l.] Columbia University Press, 2015.

BRASIL. LEI No 12.651, de 25 de maio de 2012. Dispõe sobre a proteção da vegetação nativa e dá outras providências. Presidên-cia da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. , 2012. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12651.htm>. Acesso em: 16 abr. 2022.

BÜSCHER, B. Payments for Ecosystem Services as Neoliberal Conser-vation: (Reinterpreting) Evidence from the Maloti-Drakensberg, South Africa. Conservation and Society, v. 10, n. 1, p. 29–41, 2012.

BVRIO. Bolsa Verde Do Rio De Janeiro. Disponível em: <https://bol-saverdebr.com/>. Acesso em: 22 ago. 2022. Carta em Defesa da Amazônia e da Mãe Terra, contra as Invasões do Capital, da Violência Bruta e dos Golpes “Verdes”. Disponível em: <https://wrm.org.uy/pt/acoes-e-campanhas/carta-em-defesa-da-amazo-nia-e-da-mae-terra-contra-as-invasoes-do-capital-da-violencia-bruta-e--dos-golpes-verdes/>. Acesso em: 16 set. 2021.

CBC. Memoria de la conferencia No 02: “La Minería en Madre de Dios - La Pampa y Frontera Pirata en Madre de Dios” - Centro Bar-tolomé de Las Casas. Disponível em: <https://cbc.org.pe/2021/11/03/memoria-de-la-conferencia-no-02-la-mineria-en-madre-de-dios-la-pam-pa-y-frontera-pirata-en-madre-de-dios/>. Acesso em: 3 ago. 2022.

CORNWALL, Andrea. Buzzwords and fuzzwords: deconstructing development discourse. Development in practice, 2007, 17. Jg., Nr. 4-5, S. 471-484.

DE PAULA, E. A.; DE JESUS MORAIS, M. O conflito está no ar: povos da floresta e espoliação sob o capitalismo verde. Estudos de Sociologia, v. 18, n. 35, 2013.

ESCOBAR, Arturo; ESCOBAR, Arturo. La invención del Tercer Mun-do: construcción y deconstrucción del desarrollo. Editorial Norma, 1998.

FAUSTINO, C.; FURTADO, F. Economia Verde, Povos das Florestas e Territórios: violações de direitos no estado do Acre. Relatoria Nacional de Direito Humano ao Meio Ambiente. Rio Branco (AC), 2015.

FEARNSIDE, P. Alta do dólar impulsiona o desmatamento na Ama-zônia. Disponível em: <https://epoca.globo.com/colunas-e-blogs/blo-g-do-planeta/amazonia/noticia/2015/04/philip-fearnside-alta-do-dolar--impulsiona-o-desmatamento-na-amazonia.html>. Acesso em: 22 ago. 2022.

FERNÁNDEZ, L. Mercurio en Madre de Dios: Concentraciones de mer-curio en peces y seres humanos en Puerto Maldonado. Carnegie Ama-zon Mercury Ecosystem Project. Research Brief, v. 1, n. 3, 2013.

FOUCAULT, M. Em defesa da sociedade. Tradução de Maria Ermanti-na Galvão. [s.l.] Martins Fontes, 2005.

FREUD, S. (Manuskript H) Paranoia. In: Aus den Anfängen der Psy-choanalyse: Briefe an Wilhelm Fliess, Abhandlungen und Notizen aus den Jahren 1887-1902. London: Imago, 1950. p. 118–123.

GARCIA, G. Amazônia: especialistas pedem que governo casse re-gistro de lotes com desmatamento ilegal. Disponível em: . Acesso em: 29 ago. 2022.

GEBARA, M. F.; AGRAWAL, A. Beyond rewards and punishments in the Brazilian Amazon: Practical implications of the REDD+ discourse. Forests, v. 8, n. 3, p. 66, 2017.

GEORGESCU-ROEGEN, N. The entropy law and the economic process. Cambridge, Mass./London: Harvard UP, 1971.

HICKEL, J.; KALLIS, G. Is green growth possible? New political economy, v. 25, n. 4, p. 469–486, 2020.

ISA. Instituto Socioambiental: Amazônia teve pior desmatamento da década em 2021. Disponível em: <https://site-antigo.socioambiental. org/pt-br/blog/blog-do-monitoramento/fique-sabendo-de-janeiro-ama-zonia-teve-pior-desmatamento-da-decada-em-2021>. Acesso em: 8 ago. 2022.

JACARANDÁ, R.; MATZEMBACHER, P. Direitos humanos e o sis-tema de justiça nos conflitos de terra na Amazônia ocidental. Revista Direito e Práxis, v. 9, p. 323–350, 2018.

KILL, J. Projeto Envira REDD+, no Acre, Brasil: certificadoras de car-bono atribuem Nível Ouro a promessas vazias. WRM Bulletin, v. 237, 29 abr. 2018.

LACAN, J. Da Psicose Paranóica e suas Relações com a Personalida-de. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1987.

_________. O seminário, livro 02: O Eu na teoria de Freud e na téc-nica da psicanalise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985. v. 1954–1955

_________. O seminário, livro 03: As psicoses. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1988. v. 1955–1956

_________. O seminário, livro 16: de um Outro ao outro. Rio de Ja-neiro: Jorge Zahar, 2006. v. 1969

_________. O seminário, livro 8: a transferência. Rio de Janeiro: Zahar, 1992a.

_________. O seminário, livro 17: o avesso da psicanálise. Rio de Ja-neiro: Jorge Zahar, 1992b.

_________. A agressividade em psicanalise. (1948). In: Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998a. p. 104–126.

_________. O estádio do espelho como formador da função do eu. (1949). In: Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998b. p. 96–103.

_________. O seminario, livro 10: a angústia (1962-1963). Rio de Ja-neiro: Zahar, 2004.

_________. O Simbólico, o Imaginário e o Real. In: Nomes-do-pai. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005. p. 9–54.

LOHMANN, L. Carbon trading, climate justice and the production of ignorance: ten examples. Development, v. 51, n. 3, p. 359–365, 2008.

LUXEMBURG, R. Die Akkumulation des Kapitals: Ein Beitrag zur ökonomischen Erklärung des Imperialismus. [s.l.] Buchhandlung Vo-rwärts Paul Singer, 1913. v. 1

MARX, K. Das Kapital, Buch 3, Vierundzwanzigstes Kapitel. Die soge-nannte ursprüngliche Akkumulation. In: Karl Marx, Friedrich Engels Werke. [s.l.] Diez, 1962. v. 23p. 741–791.

_________. O Capital. Crítica da Economia Política: Livro Terceiro: O Processo Global da Produção Capitalista. Tomo 1. (Coordenação e revi-são de Paul Singer Tradução de Regis Barbosa e Flávio R. Kothe). São Paulo: Nova Cultural, 1986.

_________. O Capital. Crítica da Economia Política. Livro Primeiro. Processo de Produção do Capital. Tomo 1. (Coordenação e revisão de Paul Singer Tradução de Regis Barbosa e Flávio R. Kothe). São Paulo: Nova Cultural, 1996.

_________. Os despossuídos: debates sobre a lei referente ao furto de madeira. [s.l.] Boitempo Editorial, 2017.

MILLER, J.-A. Suture (Elements of the Logic of the Signifier). Screen, v. 18, n. 4, p. 24–34, 1977.

OUMA, S.; JOHNSON, L.; BIGGER, P. Rethinking the financialization of ‘nature’. Environment and Planning A: Economy and Space, v. 50, n. 3, p. 500–511, 2018.

SCHMIDLEHNER, M. F. Os desdobramentos do capitalismo de desastre no Acre - a adicionalidade do medo. Contra Corrente: territórios de disputa, Rede Brasil. n. 5, 2012.

SCHMIDLEHNER, M. F. Soluções Baseadas na Natureza: arma mila-grosa para salvar o clima ou “solução final” para as florestas e seus po-vos? Golpe Verde: falsas soluções para o desastre climático, v. 1, p. 21–29, 2021.

TELES, D.; SOUZA, I. Entrevista com Dercy Teles de Carvalho Cunha. Dossiê ACRE, p. 37–39, 2012.

WILSON, J. The shock of the real: The neoliberal neurosis in the life and times of Jeffrey Sachs. Antipode, v. 46, n. 1, p. 301–321, 2014.

WRM. Além das florestas: ONGs conservacionistas se transformam em “empresas”. WRM Boletim, v. 242, 28 abr. 2019.

ŽIŽEK, S. The ticklish subject: The absent center of political ontology. [s.l.] Verso, 1999.

________. Violência: seis reflexões laterais. São Paulo: Boitempo Edi-torial, 2015. Ebook disponível em: <https://fliphtml5.com/qcgcj/gmqq/basic>. Acesso em: 12 abr. 2023.

Downloads

Publicado

2023-11-16

Como Citar

SCHMIDLEHNER, Michael Franz. Ciclos de violência na Amazônia:: uma análise à luz dos conceitos de Violência Extrema e Real do Capital. Revista de Filosofia Instauratio Magna, [S. l.], v. 3, n. 1, p. 121–152, 2023. DOI: 10.36942/rfim.v3i1.771. Disponível em: https://periodicos.ufabc.edu.br/index.php/instauratiomagna/article/view/771. Acesso em: 2 maio. 2024.

Edição

Seção

Dossiê