Revista Inclusão e Sociedade, v.4, n.1, 2024
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EXPERIÊNCIAS EM ESCOLAS E CLASSES BILÍNGUES: DESAFIOS E
ESTRATÉGIAS NA EDUCAÇÃO DE SURDOS DURANTE A
PANDEMIA A PARTIR DAS PERCEPÇÕES DOS DOCENTES
EXPERIENCES IN BILINGUAL SCHOOLS AND CLASSES: CHALLENGES
AND STRATEGIES IN THE EDUCATION OF THE DEAF DURING THE
PANDEMIC FROM THE PERCEPTIONS OF TEACHERS
EXPERIENCIAS EN ESCUELAS Y CLASES BILINGÜES: RETOS Y
ESTRATEGIAS EN LA EDUCACIÓN DE SORDOS DURANTE LA PANDEMIA
DESDE LA PERCEPCIÓN DE LOS DOCENTES
Mayara Vieira dos Santos
1
, Kate Mamhy Oliveira Kumada
2
, Adriana Pagaime
3
Resumo
Este artigo tem o objetivo de analisar como a pandemia do Covid-19 impactou o cenário da
educação de surdos no Brasil, durante os primeiros meses de ensino remoto. A metodologia
empregada para realização deste artigo foi uma abordagem mista quantitativa e qualitativa,
trabalhando com o recorte de dados de classes e escolas bilíngues advindos de uma pesquisa
maior sobre inclusão escolar em tempos de pandemia. Os resultados trouxeram uma análise
reflexiva sobre as práticas pedagógicas com estudantes surdos, realizadas durante a pandemia.
Com isso é possível concluir que as tecnologias foram e são importantes ferramentas para
1
Especialista em Educação Especial e Inclusiva, Universidade Federal do ABC (UFABC)
2
Doutora em Educação Especial, Universidade Federal do ABC (UFABC)
3
Doutora em Educação, Fundação Carlos Chagas (FCC)
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garantir o direito à educação, tendo amenizado os impactos negativos da suspensão das aulas
presenciais para os estudantes surdos no período.
Palavras-chave: Educação dos surdos. Educação bilíngue. Educação inclusiva.
Abstract
This article aims to analyze how the Covid-19 pandemic impacted the scenario of deaf
education in Brazil, during the first months of remote teaching. The methodology used to carry
out this article was a mixed quantitative and qualitative approach, working with data from
bilingual classes and schools arising from a larger research on school inclusion in times of
pandemic. The results brought a reflective analysis of pedagogical practices with deaf students,
carried out during the pandemic. With this, it is possible to conclude that technologies were and
are important tools to guarantee the right to education, having mitigated the negative impacts
of the suspension of face-to-face classes for deaf students in the period.
Keywords: Deaf education. Bilingual education. Inclusive education.
Resumen
Este artículo tiene como objetivo analizar cómo la pandemia de Covid-19 impactó en el
escenario de la educación de sordos en Brasil, durante los primeros meses de enseñanza a
distancia. La metodología utilizada para la realización de este artículo fue un enfoque mixto
cuantitativo y cualitativo, trabajando con datos de clases y escuelas bilingües provenientes de
una investigación más amplia sobre inclusión escolar en tiempos de pandemia. Los resultados
trajeron un análisis reflexivo de las prácticas pedagógicas con estudiantes sordos, realizadas
durante la pandemia. Con ello, es posible concluir que las tecnologías fueron y son herramientas
importantes para garantizar el derecho a la educación, habiendo mitigado los impactos
negativos de la suspensión de clases presenciales para estudiantes sordos en el período.
Palabras-clave: Educación de sordos. Educación bilingue. educación inclusiva.
Introdução
Muitos dos desafios enfrentados para a escolarização de aprendizes surdos nos dias
atuais podem ser atribuídos pelos séculos de privação de direitos, incluindo o direito à educação,
que marcam a trajetória histórica das pessoas surdas no Brasil e no mundo.
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No período da antiguidade, os gregos consideravam os surdos como sub-humanos,
pois acreditavam que se o homem não pudesse falar (oralmente), logo também não conseguiria
pensar (Strobel, 2008). Os conhecimentos eram restritos aos surdos, sendo privados de serem
educados formalmente. Na mesma época, além de não serem autorizados à instrução, os
romanos impediam os surdos de estabelecerem matrimônio, acessarem bens e heranças
(Guarinello, 2007).
A igreja católica da idade média considerava os surdos como sem salvação, ou seja,
não iriam para o reino de Deus após a morte. Conforme Goldfeld (2002), a transformação dessa
ideia teve início a partir de um monge beneditino Ponce de León (1520-1584), um dos primeiros
educadores de surdos que registro. Seus alunos surdos eram filhos de nobres, preocupados
com a exclusão social (e do testamento) de seus filhos. Foi o precursor no desenvolvimento de
uma metodologia de educação para crianças surdas, utilizando estratégias como datilologia
(representação manual das letras do alfabeto), escrita e oralização.
É válido pontuar que os métodos educacionais para surdos divergiram ao longo do
tempo, dividindo-se em três principais abordagens elaborando modelos de ensino para se
trabalhar com esses discentes. Sendo eles o: oralismo, comunicação total e o bilinguismo.
A proposta mais antiga foi pautada no que se convencionou chamar de Oralismo. Em
síntese, os defensores dessa abordagem concebem a surdez como uma deficiência que precisa
ser “normalizada” por intermédio do aprendizado da língua oral e de técnicas como a da leitura
orofacial. Salles et al. (2004, p. 55-56) afirma:
A metodologia é pautada no ensino de palavras e tais atitudes respaldam-se na
alegação de que o surdo tem dificuldade de abstração. Aprender a falar tem um peso
maior do que aprender a ler e a escrever. Assim, o surdo é considerado como
deficiente auditivo que deve ser curado, corrigido e recuperado.
Por sua vez, o método visual foi guiado na escolarização de surdos a partir do uso da
língua de sinais (na época ainda não reconhecida com status linguístico). Em virtude do embate
entre essas duas abordagens educacionais, Goldfeld (2002) pontua que, em 1880, no II
Congresso Internacional de Educadores de Surdos, realizado em Milão, foi colocado em
votação qual método deveria ser utilizado na educação dos surdos. Na ocasião, o oralismo
venceu e o uso da língua de sinais foi oficialmente proibido.
Quase um século depois, com o insucesso das práticas oralistas, os sinais retornam ao
ambiente escolar favorecido por uma nova abordagem educacional: a Comunicação Total.
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Diferentemente do Oralismo, a Comunicação Total considera que o aprendizado da ngua oral
não assegura o pleno desenvolvimento da criança surda. Defende a aprendizagem da língua oral
pela criança surda, porém concebe que os aspectos cognitivos, emocionais e sociais não devem
ser dissociados, da aprendizagem da língua oral. Para chegar a esse desenvolvimento integral
do surdo, seus defensores pregam a utilização de qualquer recurso espaço-visual como
facilitador da comunicação, dentre esses, figuras, escrita, apontamento e o uso dos sinais
(Capovilla, 2001).
O autor traz a reflexão sobre a comunicação total:
Assim, com a Comunicação Total, embora os sinais tivessem sido admitidos à escola
para auxiliar a aquisição da língua falada e escrita, e não como uma língua em seu
próprio direito, a língua falada sinalizada não parecia mais suficiente para a
comunidade que acabava de abrir os olhos à riqueza da Língua de Sinais. Ainda mais
agora que dados experimentais haviam se acumulado o suficiente para fornecer um
arsenal de razões concretas para questionar metodologicamente a prática exclusiva da
língua falada sinalizada em sala de aula e para considerar seriamente a perspectiva do
Bilinguismo. (Capovilla, 2001, p. 1486)
A retomada dos sinais no contexto educacional de surdos associado ao reconhecimento
linguístico dos sinais, a partir da descrição gramatical feita por Stokoe (1960), propiciou a
emergência da abordagem educacional bilíngue (também conhecida como bilinguismo). A
proposta de educação bilíngue para surdos parte de uma nova concepção, não apenas
linguística, mas de alteridade na valorização da diferença cultural e sócio histórico. O respeito
pela diferença linguística compõe a formação de identidade cultural do sujeito surdo, tal como
propõe as diretrizes mundiais sobre educação da Declaração de Salamanca:
[...] políticas educacionais deveriam levar em total consideração as diferenças e
situações individuais. A importância da linguagem de signos
4
como meio de
comunicação entre os surdos, por exemplo, deveria ser reconhecida e provisão deveria
ser feita no sentido de garantir que todas as pessoas surdas tenham acesso à educação
em sua língua nacional de signos. Devido às necessidades particulares de
comunicação dos surdos e das pessoas surdas/cegas, a educação deles pode ser mais
adequadamente provida em escolas especiais ou classes especiais e unidades em
escolas regulares. (Organização das Nações Unidas para a Educação, A Ciência e a
Cultura, 1994, não paginado)
A esse respeito, Pereira (2000, p. 98) contribui afirmando:
Adquirida a língua de sinais, terá um papel fundamental na aquisição da segunda
língua, o português, que será adquirida através da leitura e da escrita. É ele que vai
possibilitar, em um primeiro momento, a constituição de um, conhecimento de
4
Cumpre lembrar que na data da Declaração de Salamanca, documento de origem desta citação, a língua de sinais
ainda não era reconhecida no Brasil, o que torna compreensível a tradução do texto como “linguagem de signos”.
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mundo, tornando possível aos alunos surdos entenderem o significado do que leem,
deixando de ser meros decodificadores da escrita. Por sua vez, a língua escrita, por
ser totalmente acessível à visão, é considerada uma fonte necessária a partir da qual o
surdo possa construir suas habilidades de língua.
Paulatinamente, a legislação no Brasil foi contribuindo para uma política pública de
valorização e respeito à Libras e à condição bilíngue das pessoas surdas, ao estabelecer no texto
da Lei n. 10.436, de 24 de abril de 2002, que “É reconhecida como meio legal de comunicação
e expressão a Língua Brasileira de Sinais - Libras e outros recursos de expressão a ela
associados” (Brasil, 2002, não paginado).
Sob o reconhecimento legal da Libras, o Decreto 5.626, de 22 de dezembro de 2005,
regulamentou a Lei n. 10.436/2002, definindo formas institucionais para o uso e a difusão da
Libras e da Língua Portuguesa, visando o acesso das pessoas surdas à educação. O referido
documento legal tratou da inclusão da Libras como disciplina curricular nos cursos de formação
de professores e nos cursos de Fonoaudiologia, da formação do professor de Libras e do
instrutor de Libras, da formação do tradutor e intérprete de Libras / Língua Portuguesa, da
garantia do direito à educação e saúde das pessoas surdas ou com deficiência auditiva e do papel
do poder público e das empresas no apoio ao uso e difusão da Libras (Brasil, 2005).
Outra conquista que coroa o reconhecimento da condição educacional bilíngue das
pessoas surdas pode ser vislumbrado a partir da Lei n. 12.319, de 1 de setembro de 2010, que
regulamentou a profissão de Tradutor e Intérprete da Língua Brasileira de Sinais - Libras e
discorre sobre sua importância na educação no art. inciso II “Interpretar, em Língua
Brasileira de Sinais - Língua Portuguesa, as atividades didático-pedagógicas e culturais
desenvolvidas nas instituições de ensino nos níveis fundamental, médio e superior, de forma a
viabilizar o acesso aos conteúdos curriculares” (Brasil, 2010, não paginado).
O Plano Nacional de Educação (PNE), aprovado pela Lei n. 13.005, de 25 de junho de
2014, que estabelece metas para educação até 2024, corrobora a difusão de uma educação
bilíngue respeitando as diferenças sociolinguísticas, que atuem na defesa de ambientes
educacionais como escolas e classes bilíngues para surdos, bem como em escolas inclusivas.
Sendo assim, a meta 4.7 nos traz:
4.7- garantir a oferta de educação bilíngue, em Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS
como primeira língua e na modalidade escrita da Língua Portuguesa como segunda
língua, aos (às) alunos (as) surdos e com deficiência auditiva de 0 (zero) a 17
(dezessete) anos, em escolas e classes bilíngues e em escolas inclusivas. (Brasil, 2014,
não paginado)
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A defesa de classes e escolas bilíngues ocorre pela consideração de que a aquisição da
língua normalmente acontece através de canais sensoriais, sendo a audição um deles, mas o
surdo utiliza-se do canal viso-motor. Deste modo, faz-se mister que as crianças surdas tenham
acesso à língua de sinais desde cedo na sua educação, seja pelas condições favoráveis para
desenvolvimento da sua língua, cultura e identidade, bem como por conseguirem se comunicar
com pares linguísticos. Essa condição está prevista na Lei Brasileira de Inclusão (Lei n. 13.146,
de 6 de julho de 2015), conforme artigo 28, inciso IV:
Incumbe ao poder público assegurar, criar, desenvolver, implementar, incentivar,
acompanhar e avaliar:
[...]
IV - oferta de educação bilíngue, em Libras como primeira língua e na modalidade
escrita da língua portuguesa como segunda língua, em escolas e classes bilíngues e
em escolas inclusivas [...] (Brasil, 2015, não paginado)
Mais recentemente, a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) (Lei n. 9.394, de 20 de dezembro
de 1996), incluiu em seu capítulo 5 disposições sobre a educação bilíngue de surdos (por meio
da Lei n. 14.191, de 3 de agosto de 2021), constando em seu art. 60-A:
Art. 60-A. Entende-se por educação bilíngue de surdos, para os efeitos desta Lei, a
modalidade de educação escolar oferecida em Língua Brasileira de Sinais (Libras),
como primeira língua, e em português escrito, como segunda língua, em escolas
bilíngues de surdos, classes bilíngues de surdos, escolas comuns ou em polos de
educação bilíngue de surdos, para educandos surdos, surdo-cegos, com deficiência
auditiva sinalizantes, surdos com altas habilidades ou superdotação ou com outras
deficiências associadas, optantes pela modalidade de educação bilíngue de surdos.
(Incluído pela Lei nº 14.191, de 2021). (BRASIL, 1996, 2021 não paginado)
Ademais, dentre outras contribuições, a conquista do texto da LDB estabeleceu o
direito à educação bilíngue desde o zero ano de idade, na educação infantil, bem como “[...]
materiais didáticos e professores bilíngues com formação e especialização [...]” (Brasil, 1996,
2021, não paginado).
Segundo Quadros (1997), no contexto brasileiro, as escolas alinhadas ao bilinguismo
conduzem o ensino a partir de duas línguas, a saber: o português e a Língua Brasileira de Sinais
(Libras). Considerando a Libras, como primeira língua, parte desse pressuposto para o ensino
da ngua escrita portuguesa como segunda língua. Considerando as particularidades em sua
comunicação, assumindo a língua viso-espacial, a língua de sinais, como língua natural. A
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diferença na modalidade da língua e do acesso a ela, implica uma distinção na maneira como
ocorre a aquisição da Libras e do português, por parte do indivíduo.
Nesse sentido, Quadros e Schmiedt (2006, p. 20) afirmam que: “As crianças com
acesso à língua de sinais desde muito cedo, desfrutam da possibilidade de adentrar o mundo da
linguagem com todas as suas nuances. A língua de sinais vai ser adquirida por crianças surdas
que tiverem a experiência de interagir com usuários fluentes na língua de sinais”.
Para além desse contexto sociolinguístico complexo vivenciado pelos surdos que se
comunicam pela Libras, em 2020, a educação de surdos, assim como toda a sociedade, sofreu
com os impactos causados pelo vírus SARS-CoV2, o qual infectou milhões de pessoas ao redor
do planeta com a doença COVID-19. Tal cenário mudou o mundo drasticamente, assim como
a realidade das escolas, somando um novo desafio aos professores que se consideravam, antes
da pandemia, despreparados para lidar com os estudantes público da educação especial (Pletsch;
Glat, 2009). Isto posto, em função da pandemia e do necessário distanciamento social, houve a
necessidade da implementação do ensino remoto emergencial, que substituiu a modalidade do
ensino presencial, exigindo que as escolas e outros segmentos da educação viessem a exercer
seu poder de adaptação, de maneira rápida, para continuar a realizar sua função social.
Segundo Albres e Jung (2021, p. 7030) “[...] [de]ntre as medidas imediatas de
prevenção à Covid-19, doença causada pelo novo Coronavírus, esteve a suspensão das
atividades presenciais nas instituições de ensino”. Com o ensino remoto ficou ainda mais
evidente as desigualdades no atendimento escolar, pois foram exigidos de muitos professores e
aprendizes o acesso e domínio de recursos tecnológicos para interação com o conteúdo
didático/curricular. Essa nova realidade dificultou a participação de vários alunos, sobretudo,
os mais afetados socioeconomicamente.
De acordo com Kyle (1999), na educação de surdos essa reflexão é ainda mais
pertinente, pois os surdos têm a Libras como primeira língua (L1) e o português como segunda
língua (L2) reconhecidos pelo ordenamento jurídico nacional (Decreto n. 5.626/2005), e são
majoritariamente pertencentes às famílias ouvintes que desconhecem a Libras, nesta
perspectiva é essencial as relações sociais e linguísticas para o desenvolvimento integral do
sujeito (Quadros; Schmiedt, 2006).
Essa realidade faz com que a escola seja o principal espaço de aquisição linguística da
Libras e da modalidade escrita do português, podendo ser entendido que seu desenvolvimento
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linguístico é agravado, portanto, pela ausência das interações sociais presenciais. Desse modo,
Shimazaki, Menegassi e Fellini (2020) pontuam que a pandemia acentuou a exclusão de alunos
surdos.
As sequelas deixadas pelo vírus do Covid-19, vão além das questões referentes a saúde
física, mental e psicológica, e no âmbito da Educação, infelizmente, irão se propagar por alguns
anos. O Parecer n. 5/2020 do Conselho Nacional de Educação (CNE) (2020) afirma que a longa
duração da suspensão das atividades escolares pode provocar um retrocessos do processo
educacional e da aprendizagem aos estudantes submetidos a longo período sem atividades
educacionais regulares, com isto este documento traz considerações para buscar e assegurar
medidas locais que garantam a oferta de serviços, recursos e estratégias para que o atendimento
dos estudantes da educação especial ocorra com padrão de qualidade.
Com base no exposto, faz-se necessário ampliar pesquisas que focalizem além dos
impactos na educação em geral, mas também as diversas modalidades educacionais, bem como
os perfis específicos dos alunos público-alvo da educação e, no caso deste estudo, dos alunos
surdos, visando assim, contribuir para a melhoria da oferta de ensino considerando as suas
especificidades.
Segundo Santos (2020, p. 32), as pessoas com deficiência estão metaforicamente no
Sul da quarentena - “[...] o Sul não designa um espaço geográfico. Designa um espaço-tempo
político, social e cultural” - sendo elas de um grupo minoritário e em vulnerabilidade, suas
especificidades muitas vezes não são respeitadas e as limitações que a sociedade lhes impõe
fazem com que se sintam a viver em quarentena permanente.
Nessa direção, muitas pesquisas já apontam para as consequências e a nova realidade
imposta às escolas em função da pandemia. Pasini, Carvalho e Almeida (2022) abordam como
isso impactou a vida dos brasileiros e do contexto educacional. Santos, Favacho e Friedrich
(2021) referem que a tecnologia se transforma em uma via possível e necessária para se fazer
chegar o ensino e permanece numa relação de proximidade, interação e afeto entre os sujeitos
da comunidade escolar englobando professores e alunos mesmo que a distância.
Shimazaki, Menegassi e Fellini (2020) defendem que a investigação sobre a educação
de surdos atrelada ao ensino remoto, traz sua relevância histórica, emergindo questões atuais
referente às demandas contemporâneas da educação, evidenciam debates precisos e contínuos,
principalmente quando ambos estão interligados.
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Vieira e Ricci (2020) fazem um elo entre as desigualdades sociais, educacionais e
tecnológicas, que foram agravados entre os estudantes com maior vulnerabilidade, durante a
pandemia, por não privilegiar todos da mesma forma, com o acesso à internet e aos recursos e
ferramentas das tecnologias que foram (e continuam sendo) imprescindíveis.
Simões (2020) traz contribuições que evidenciam que os mais atingidos pela pandemia
com as aulas remotas, foram os alunos surdos, atrelados ao acesso precário ou a ausência das
tecnologias.
Evidenciando o quanto temos que avançar para conquistar a equidade na educação,
Shimazaki, Menegassi e Fellini (2020) corroboram essa asserção ao declararem que ao se
ofertar o ensino remoto, a exclusão desses estudantes torna-se mais um agravante diante do
cenário pandêmico e das condições impostas.
Martins et al. (2020) sintetiza três motivos que preocupam em relação ao isolamento
social de crianças surdas: 1) a ausência de interlocutores proficientes em Libras, neste período
de restrições comunicativas e suas implicações para a apropriação da língua de sinais tardia; 2)
a desinformação diante aos desafios linguísticos entre pais e filhos surdos; e 3) a falta de
recursos e ferramentas de entretenimento para crianças surdas em língua de sinais.
Complementarmente, Pasini, Carvalho e Almeida (2022) contribuem trazendo uma
relação de ferramentas e aplicativos utilizados por professores durante o ensino remoto que
enriquecem a prática pedagógica e que podem ser utilizados para além do período de suspensão
das aulas presenciais.
Tendo em vista o que foi exposto acerca do contexto e da necessária investigação sobre
o alunado surdo e a atuação docente, apresentamos a seguir os objetivos e a metodologia
aplicada nesta pesquisa.
Objetivos
O objetivo geral da pesquisa consiste em analisar como a pandemia do Covid-19
impactou o cenário da educação de surdos no Brasil, durante os primeiros meses de ensino
remoto. Com isso espera-se refletir sobre as condições vivenciadas, diante desse contexto e os
desdobramentos enfrentados por professores e por esses estudantes.
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Para tanto, buscamos delinear as estratégias e os desafios enfrentados pelos docentes
que atuavam nas escolas e classes bilíngues para surdos, a partir de um recorte da pesquisa
“Inclusão escolar em tempos de pandemia”, desenvolvida por Pagaime et al. (2020).
Método
A pesquisa realizada é de caráter misto, ou seja, quanti-quali. Nesse sentido, envolve
a pesquisa quantitativa, no sentido de abordar representatividades numéricas, ou seja, os dados
trabalhados podem ser quantificados, através de amostras usando uma linguagem matemática
para descrever as causas de um fenômeno e/ou as relações entre as variáveis (Schneider; Fujii;
Corazza, 2017).
Segundo a autora, na pesquisa mista, os procedimentos de coleta e análise quantitativos
podem ser aliados à pesquisa qualitativa, permitindo a realização de inferências, pautadas em
uma análise descritiva e não se limitando aos aspectos de quantificação. Ademais, busca
aprofundar a compreensão do objeto de pesquisa em questão. Schneider, Fujii e Corazza (2017)
trazem contribuições evidenciando que a pesquisa pode se beneficiar dos dois métodos,
aproveitando a abordagem qualitativa e quantitativa, sendo que uma pode apoiar a outra.
Em consonância com Fonseca (2002), a utilização conjunta da fusão entre a pesquisa
qualitativa e quantitativa permite recolher mais informações do que se poderia conseguir
isoladamente.
Contexto de pesquisa e perfil dos participantes
Esta pesquisa apresenta resultados parciais relativos à participação de professores de
escolas e classes bilíngues para surdos, na pesquisa “[nome da pesquisa]”, desenvolvida por um
grupo de pesquisadores das seguintes instituições: [instituições participantes]. Com o objetivo
de identificar as estratégias didáticas e os desafios enfrentados pelos docentes da educação
básica que atuam com alunos público-alvo da educação especial, a pesquisa foi autorizada pelo
comitê de ética em pesquisa da Universidade Federal do ABC, sob Parecer 4.040.480 - CAEE
nº 31746620.0.0000.5594.
O contexto geral de coleta de dados ocorreu no período de 10 a 27 de julho de 2020,
recebendo a participação voluntária de 1.594 docentes de todas as 27 Unidades da Federação,
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os quais responderam ao questionário composto por 26 perguntas fechadas e 3 abertas
(Pagaime, et al., 2020).
Destacamos que os aspectos necessários para a garantia de um ambiente acessível,
foram pensados e projetados para que os participantes tivessem a melhor experiência tendo
como pilar fundamental a inclusão, presente durante todo desenvolvimento da pesquisa. Os
responsáveis pelo questionário firmaram de fato, uma ação em favor da inclusão e
acessibilidade, ao trabalhar para a realização e a viabilização de um questionário acessível
recorrendo à plataforma eletrônica (Survey Monkey), com o intuito de garantir a usabilidade
aos participantes de modo a respeitar as particularidades de cada sujeito (Pagaime, et al., 2020).
O conteúdo foi integralmente traduzido para a Libras e submetido à pré-testagem por
pessoas surdas e uma surdocega. Também contribuíram com essa etapa de pré-testagem
professores cegos usuários de leitores de tela; pessoas com baixa visão, no que se refere ao
contraste - cor de fundo e tipo de fonte e, também professoras com deficiência física, sendo
uma delas usuária de tecnologia de rastreamento facial (Pagaime, et al., 2020).
Para o presente trabalho delimitamos as informações dos respondentes, apenas aos
docentes que atuam em classes e escolas bilíngues, por focar no público-alvo da educação
especial que estamos abordando nesta pesquisa, ou seja, os surdos.
Sobre o perfil desses docentes, temos que: 31 delas se declararam do sexo feminino e
sete do sexo masculino, em relação a cor/raça 22 participantes se declararam brancos, 13 pretos
ou pardos e três amarelos. Em relação à condição de deficiência, dois indicaram ter deficiência
física e três docentes assinalaram ser surdos (usuário de Libras).
Apesar da pesquisa maior ter atingido todos os estados brasileiros, ao fazermos o
recorte com os docentes que atuam em escolas ou classes bilíngues de surdos, não tivemos
respondentes de nenhum estado da região sul do Brasil. Conforme se verifica na Tabela 1, a
maior representatividade encontra-se no Sudeste, especialmente no estado de São Paulo
(81,6%).
Tabela 1. Unidade da Federação de atuação docente dos respondentes
Estados
AM
BA
DF
PE
RJ
SP
Total
Quantidade de
respondentes
1
1
1
2
1
31
38
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Fonte. Elaborado pelas autoras
O destaque em relação à unidade da federação de atuação dos docentes nos leva a
refletir sobre o alcance da pesquisa maior, que abrangeu o país todo, mas também ao fato do
alcance entre esse perfil de docentes. Apesar de inicialmente parecer um número pequeno de
respondentes, o que não nos permite fazer generalizações, por não ser uma pesquisa
representativa, é fundamental trabalharmos com esses dados, pois conforme demonstrado em
nossa introdução, os dados concernentes à educação de surdos na pandemia ainda são escassos.
Com relação à rede de ensino de atuação, 23 (61%) professores indicaram vínculo com
a rede pública municipal; 10 (26%) com a rede estadual; um docente (3%) assinalou atuar na
pública federal; e, quatro (10%) estavam atuando na rede privada de ensino. Tal panorama pode
reforçar a hipótese de esse alunado estar, majoritariamente, na rede pública de ensino.
Semelhantemente, na análise dos demais estudantes público-alvo da educação especial, como
investigado em nossa pesquisa maior, observamos que a maioria, ou o equivalente a 93%, dos
respondentes eram da rede pública (Pagaime, et al., 2020).
A etapa/modalidade de ensino de atuação dos participantes, apresenta-se na Tabela 2:
Tabela 2. Etapa/modalidade de ensino de atuação docente
Etapa/modalidade de ensino
Quantidade de respondentes
%
Anos iniciais do Ensino
fundamental
10
26,3
Anos finais do Ensino
fundamental
15
39,5
Ensino Médio
10
26,3
Educação de Jovens e Adultos
3
7,9
Fonte. Elaborado pelas autoras
Ainda sobre a análise do perfil de respondentes, nota-se que a maior concentração de
professores está no ensino fundamental, sendo 10 deles com atuação nos anos iniciais do Ensino
Fundamental, 15 nos anos finais do Ensino Fundamental, 10 no Ensino Médio e 3 indicaram
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trabalhar na Educação de Jovens e Adultos (EJA). Assim, diante do contexto delineado, na
sequência apresentamos os resultados e discussão.
Resultados e discussões
Para responder ao objetivo desta pesquisa, apresentaremos os dados relativos às
estratégias e desafios enfrentados pelos docentes das escolas e classes bilíngues para surdos.
Vale destacar que dentre os 38 respondentes, apenas uma informou que no primeiro
quadrimestre de suspensão das aulas presenciais, a rede/escola em que atuava ainda não havia
implementado o ensino remoto. Segundo a professora:
P1
5
- Paramos totalmente no 1º semestre e desenvolvemos apenas trabalho interno
remotamente. O [nome da escola]
6
, onde trabalho, criou um site da Educação Básica
e divulgamos várias atividades e vídeos informativos em Libras. Nesse segundo
semestre, vamos iniciar a entrega de material impresso com revisão do que foi dado
presencialmente antes da pandemia. Em uma segunda etapa, a intenção é adotar uma
plataforma de ensino. A proposta está sendo construída pela escola.
Em geral, naquele período, segundo a pesquisa maior de Pagaime, et al. (2020), cerca
de 7% das redes de ensino não haviam conseguido se organizar para o ensino remoto. Esse
resultado também se refletiu em nosso contexto focalizado na educação bilíngue para surdos.
Sobre as estratégias relativas ao ensino remoto, a presente pesquisa elencou algumas
possibilidades para respostas objetivas, mas também havia perguntas abertas que permitiam a
complementação por parte dos respondentes.
A Figura 1 apresenta resultados advindos da questão fechada envolvendo as
ferramentas utilizadas por docentes durante o ensino remoto. Ressalta-se ainda que os docentes
poderiam assinalar mais de uma resposta
5
Para garantir o anonimato dos respondentes, utilizamos na indicação das respostas abertas, a letra P (Professor/a)
seguida da numeração que indica a organização dos dados na planilha de análise.
6
O nome da escola foi omitido para preservar a identidade da professora participante.
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Figura 1. Ferramentas utilizadas pelos docentes das escolas e classes bilíngues de surdos
Fonte. Elaborado pelas autoras
Descrição da Figura 1: Gráfico de barras de porcentagem na horizontal das ferramentas utilizadas pelos
docentes das escolas e classes bilíngues de surdos, que mostram os resultados da pesquisa que
correspondem a 57,9% (n=22) das indicações para as aulas gravadas pelo próprio professor, seguido de
42,1% (n=16) pautados pelo uso do material impresso, 28,9% (n=11) indicaram a oferta de aulas ao vivo
(online) e15,8% (n=6) tiveram seu ensino mediado por aulas via TV e a opção de aulas via rádio não
teve nenhum respondente.
Dentre os que estavam participando da oferta de ensino remoto, a estratégia mais
utilizada foram as aulas gravadas pelo próprio professor com 57,9% (n=22) das indicações,
seguido de 42,1% (n=16) pautados pelo uso do material impresso, 28,9% (n=11) indicaram a
oferta de aulas ao vivo (online) e 15,8% (n=6) tiveram seu ensino mediado por aulas via TV.
Em relação a opção de aulas via rádio, era esperado que essa estratégia não se apresentasse
no contexto educacional bilíngue para surdos, dado que se reconhece no Decreto n. 5.626
que a pessoa surda é um sujeito visual, sendo compreendida como “[...] aquela que, por ter
perda auditiva, compreende e interage com o mundo por meio de experiências visuais,
manifestando sua cultura principalmente pelo uso da Língua Brasileira de Sinais - Libras”
(Brasil, 2005, não paginado, grifo nosso). Assim, a expectativa se manteve, pois não houve
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menção entre os participantes ao uso do rádio como alternativa de ensino remoto para surdos,
embora isso tenha aparecido entre os docentes respondentes que atuam com outros estudantes,
inclusive aqueles que atuam com o público da educação especial, conforme demonstrado por
Pagaime, et al. (2020).
A partir do exposto, verifica-se uma predominância de aulas gravadas pelos
professores e o uso de material impresso no ensino remoto adotado pelas classes e escolas
bilíngues para surdos. Apesar disso, cabe pontuar que 34% dos respondentes informaram adotar
outras estratégias, tal como ilustram os excertos a seguir:
P2 - Ensino remoto, vídeo em libras produzidos por mim, atividades
complementares em pdf e vídeos explicativos em libras, suporte pedagógico pelo
WhatsApp web. (grifos nossos)
P3 - Plataforma Google Sala de Aula com adequação do [material da escola]. (grifos
nossos)
P4 - Postagem de vídeos com atividades, em plataforma e, acompanhamento de
material impresso entregue pela rede. (grifos nossos)
P5 - Uso da plataforma Google Class. Produção de vídeo por mim para dar
acessibilidade aos alunos surdos. Adaptação de atividades para os alunos múltiplos
7
.
(grifos nossos)
P6 - [aulas por] Vídeo chamada. (grifos nossos)
Desse modo, a partir de relatos dos professores, é possível aferir que houve uma grande
contribuição das tecnologias digitais no período de suspensão das aulas presenciais, sendo
vários os recursos que mediaram a interação entre as escolas e os estudantes surdos, além de
muita mobilização por parte dos professores, dentre esses destacam-se a plataforma Google, as
vídeo-chamadas e os materiais digitais (pdf).
Em razão da especificidade da comunicação em Libras, diferentemente da estratégia
mais utilizada no geral do público-alvo da educação especial - material impresso 58% nas
classes comuns e 65,7% nos serviços especializados (Pagaime, et al., 2020), na presente
pesquisa apreendemos que as aulas gravadas pelo próprio docente foi a principal estratégia.
Contudo, estima-se que esta tenha demandado um esforço adicional na sua preparação, pois
além da necessidade de equipamentos e softwares de tecnologia específica, a produção de
videoaulas demanda, por exemplo, um conhecimento para gravação, edição e publicação dos
vídeos.
7
Alunos com deficiência múltipla.
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O excerto de P7 evidência essa dedicação extra, apontando para uma dificuldade
atrelada a esse contexto:
P7 - Os professores e intérpretes da escola bilíngue de surdos onde trabalho têm
enfrentado o desafio de fazer vídeos profissionais em casa. Normalmente, esses vídeos
são feitos em estúdio e existe um editor. A demanda aumentou muito e os professores
têm tido que editar seus próprios vídeos também.
Ao serem questionados se receberam orientações para preparar/ministrar
aulas/atividades não presenciais da rede ou da escola, 19 docentes (equivalente a 50%)
indicaram que sim. Já em relação às orientações às famílias na realização das atividades em
casa e/ou para uso de recursos de acessibilidade, apenas 34,2% (n=13) relataram terem sido
orientados, o que reforça a percepção de trabalho mais individualizado desse grupo durante o
período investigado, conforme representa a Figura 2:
Figura 2. Orientações para os docentes realizadas pela rede que atuam
Fonte. Elaborado pelas autoras
Descrição da Figura 2 : Gráfico de barras de porcentagem na vertical das orientações para os docentes
realizadas pela rede que atuam, que mostram os resultados da pesquisa que correspondem a 50% (n=19)
afirmaram que receberam orientações para preparar/ministrar aulas/atividades não presenciais da rede
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ou da escola e ao lado aparece a informação que 34,2% (n=13) afirmam erem sido orientados em
relação às orientações às famílias na realização das atividades em casa e/ou para uso de recursos de
acessibilidade.
Em relação à percepção do docente quanto às principais barreiras enfrentadas pelos
alunos surdos, a Figura 3
8
ilustra que essas foram inúmeras ao longo da pandemia e, em especial
nos primeiros meses de suspensão das aulas presenciais. O destaque se para a indicação de
81,6% (n=31) dos participantes perceberem o acesso à internet pelos estudantes surdos como a
maior dificuldade. Na sequência, a alteração da rotina para o aluno realizar atividades da escola
em casa foi percebida como agravante por 73,7% (n=28), sendo a falta de equipamentos
(celular, computador, notebook, tablet) apontada pela mesma quantidade de docentes (n=28).
Figura 3
9
. Principais barreiras enfrentadas pelos alunos surdos
Fonte. Elaborado pelas autoras
Descrição da Figura 3: Gráfico de barras na horizontal de porcentagem, contendo as informações sobre
as principais barreiras enfrentadas pelos alunos surdo, sendo que 81,6% (n=31) dos participantes
8
A quantidade expressa na Figura 3, referente ao número de docentes, considera apenas os professores que
estavam atuando no ensino remoto, como já mencionado, um professor informou que até a presente data (da
realização da pesquisa) não havia aderido ao formato de ensino remoto.
9
Os docentes poderiam assinalar mais de uma resposta.
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perceberem o acesso à internet pelos estudantes surdos como a maior dificuldade. Na sequência, 73,7%
(n=28) a alteração da rotina para o aluno realizar atividades da escola, também com73,7% (n=28) a falta
de equipamentos (celular, computador, notebook, tablet). 55,3% (n=21) assinalaram o ambiente
inadequado para estudo. 52,6% (n=20) falta de recursos de tecnologia assistiva . 47,4% (n=18) à falta
de acessibilidade do material impresso recebido pelos alunos surdos. 44,7% (n=20) a falta de
mediadoras/es para realização das tarefas e 28,9% (n=11) responderam a ausência de intérprete/tradução
em Libras.
O ambiente inadequado para estudo foi referido por 55,3% (n=21) e, por sua vez, a
falta de recursos de tecnologia assistiva foi um obstáculo para 52,6% (n=20) das professoras e
professores desta pesquisa.
Outro desafio apontado pelos respondentes, diz respeito à falta de acessibilidade do
material impresso recebido pelos alunos surdos, sendo pontuado por 47,4% (n=18) dos
respondentes. Já, a falta de mediadoras/es para realização das tarefas foi assinalada por 44,7%
(n=20).
A ausência de intérprete/tradução em Libras foi a alternativa menos indicada, por
apenas 11 docentes (28,9%). Contudo, uma hipótese para este resultado pode ser atribuída ao
fato de que, em classes e escolas bilíngues, é comum que o professor seja fluente em Libras e
dispense a mediação de um profissional tradutor e intérprete de Libras-Português. Dessa forma,
tendo em vista que a principal estratégia adotada por esses participantes, conforme mencionado
anteriormente, foram as aulas gravadas pelo próprio professor, é possível inferir que esta função
acabou sendo acolhida por esses mesmos profissionais.
Os dados obtidos na realização do questionário nos trazem uma reflexão acerca dos
impactos da pandemia para educação, com questões já existentes no ensino presencial, mas que
tiveram suas proporções ampliadas com o ensino remoto, 80% (n=30) dos docentes referiram
preocupação com a aprendizagem dos alunos surdos; 63,2% (n=24) dos professores relatam ter
diminuído a interação desses alunos com os colegas de classe, no formato remoto; 52,6% (n=20)
referiram preocupação com o aumento do risco de evasão/abandono.
Um impacto positivo durante o ensino remoto na pandemia foi a relação família-
escola, 37% dos professores disseram ter aumentado essa parceria tão importante para o
ensino/aprendizagem. Realizar parcerias com a família durante o período do ensino remoto se
tornou vital para evitar evasão escolar (Almeida; Rodrigues, 2021).
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Refinando os dado, nesta pesquisa ainda foi possível no que se refere a prática
pedagógica atrelada a acessibilidade dos alunos surdos, observar os dados coletados de quais
recursos de acessibilidade que atenderam os perfis de estudantes surdos, foram utilizados
durante o ensino remoto, 47,4% (n=18) dos docentes disseram que contaram com intérprete de
Libras, em relação ao material impresso, 31,6% (n=12) assinalaram ter acompanhado de
ilustração e/ou tradução em Libras e 18,4% (n=7) disseram ter providenciado legenda.
Após indicar, na visão docente, as principais barreiras enfrentadas pelos alunos, a
pesquisa possibilitou que os professores indicassem as maiores dificuldades por eles
enfrentadas, as quais estão dispostas na Figura 4.
Figura 4
10
. Maiores dificuldades enfrentadas pelos docentes no ensino remoto
Fonte. Elaborado pelas autoras
Descrição da Figura 4: Gráfico de barras de porcentagem na horizontal contendo as informações sobre
as maiores dificuldades enfrentadas pelos docentes no ensino remoto sendo que 60,5% (n=23)
responderam ter dificuldades em trabalhar com alunos a distância. 57,9 % (n=22) disseram ter
dificuldades em promover atividades em que todos possam participar. 52,6% (n=20) responderam ter
10
Os docentes poderiam assinalar mais de uma resposta ou nenhuma.
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algumas dificuldades para estimular a participação dos alunos surdos no grupo. 44,7% (n=17)
disseram ter dificuldade em atender as especificidades dos alunos surdos.31,6% (n=12) relataram
dificuldades contato com os alunos e/ou familiares e28,9% (n=11) disseram desconhecer ou ter pouco
domínio dos recursos de acessibilidades das plataformas online.
As novas demandas exigiram uma reformulação dos professores, do ponto de vista das
práticas pedagógicas que se adaptaram para o ensino remoto, com isto, as adversidades
enfrentadas pelos docentes emergiram ou ficaram mais acentuadas, conseguimos perceber que
a maior dificuldade diante deste contexto, foi trabalhar com esse grupo a distância, sendo
mencionadas por 60,5% (n=23), além das dificuldades em promover atividades em que todos
possam participar, assinalada por 57,9% (n=22), seguida da socialização e interação para
estimular a participação dos alunos surdos no grupo, citada por 52,6% (n=20). Tal como
retratado no gráfico 4, essas foram as respostas mais assinaladas pelos docentes.
Segundo Almeida e Rodrigues (2021), os docentes superaram o desafio do ensino
remoto ao fazer reajustes nas suas práticas de ensino/aprendizagem utilizando como
ferramentas as tecnologias para o ensino de surdos. Durante a pandemia, educadores, educandos
e suas famílias passaram a lidar cotidianamente com as múltiplas implicações da palavra
imprevisibilidade, tendo que ressignificar e (re)aprender formas de ensinar e conviver em
sociedade (Amaral, 2020).
Para além dos dados apresentados, em espaço aberto para comentários, os professores
de classes e escolas bilíngues para surdos, revelaram ainda a preocupação com os estudantes
surdos associados a outras condições como a surdocegueira e a deficiência múltipla.
P8 - Alunos múltiplos, surdos-cegos, surdos. A organização do material impresso e a
dinâmica de organização de aula à distância não foram pensadas para esse público. A
responsabilidade de dar acessibilidade ficou somente a cargo da escola e dos
professores.
P9 - Existem muitos alunos com deficiência que necessitam do contato como os
alunos com múltiplas deficiências, surdocegos, bebês e crianças pequenas [...]. É
preciso olhar todas as especificidades pra não colocar sobre o professor ações
impossíveis de na prática serem realizadas!
Dessa forma, tais relatos reforçam a necessidade de investimentos em recursos e
formações pedagógicas para atuação não somente com alunos surdos, mas também com alunos
com deficiência múltipla, que conforme indicado pelos docentes, ainda estão à margem das
práticas realizadas. Nessa direção, Vilela, Azevedo e Ramos (2020) ressaltam que os impactos
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necessários frente à realidade da pandemia exigiram recursos de tecnologia assistiva para
auxiliar de maneira positiva as pessoas com surdocegueira, evidenciando possibilidades em
meio à isenção sensorial da visão e audição, repensando estratégias para comunicação e
recepção de informações por parte desses sujeitos.
Considerações finais
Esta pesquisa contribui para fomentar diálogos importantes e atuais sobre a educação
de surdos, refletindo e analisando dados e considerações de uma pesquisa maior intitulada
Inclusão Escolar em Tempos de Pandemia (Pagaime, et al., 2020). Os resultados aqui
apresentados abordam um recorte inédito sobre a educação de surdos e as principais estratégias
e dificuldades sob a óptica de docentes que atuaram na linha de frente com o ensino remoto
durante a pandemia, abordando suas realidades diante das novas demandas como o uso efetivo
da tecnologia aliada à educação.
Constatou-se que a pandemia se configurou como mais uma barreira para os
estudantes surdos, pois o ensino remoto trouxe novos desafios para os docentes, para além do
trabalho a distância e, muitas vezes, assíncrono, tal como o de atender as especificidades desses
aprendizes, estimulando sua participação no grupo e evitando a evasão escolar. Assim, apesar
das contribuições das tecnologias digitais na redução dos impactos causados pelo
distanciamento social, outras dificuldades foram vislumbradas nesse processo, tal como a
garantia do acesso, participação e assiduidade devido principalmente ao acesso à internet,
frequentemente precária.
Ademais, os professores tiveram que se reinventar na busca por estratégias
pedagógicas e didáticas acessíveis aos estudantes surdos, o que tornou fulcral a colaboração e
orientações promovidas pelas redes e escolas para preparar/ministrar aulas/atividades o
presenciais.
Isso posto, esperamos que os dados e reflexões desta pesquisa possam contribuir para
se pensar os impactos do ensino remoto realizado durante a pandemia junto ao alunado surdo
em contexto de classes e escolas bilíngues. Acredita-se ainda na importância de novas pesquisas
que acompanhem o retorno desses estudantes para identificar e sanar possíveis lacunas causadas
a esse grupo tradicionalmente fragilizado pela carência de educadores capacitados e materiais
didáticos acessíveis.
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Assunção. Surdocegueira e as possibilidades em meio a pandemia por COVID-19. Revista
Brasileira de Pesquisa (Auto)Biográfica, Salvador, v. 5, n. 16, p. 1563-1576, 2020.
https://doi.org/10.31892/rbpab2525-426X.2020.v5.n16.p1563-1576
Recebido em: 02/02/2024
Aceito em: 16/02/2024